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João da Cruz, Mariana e Simão no filme Amor de Perdição. |
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Teresa e Tadeu de Albuquerque no filme Amor de Perdição. |
- Simão: o narrador da obra na introdução faz uma caracterização de Simão. Este passa a dizer: “Simão António Botelho, que assim disse chamar-se, ser solteiro e estudante na universidade de Coimbra, natural da cidade de Lisboa(…) filho de Domingos José Correia Botelho e de D. Rita Preciosa Caldeirão Castelo Branco; estatura ordinária, cara redonda, olhos castanhos, cabelo e barba preta, vestido com jaqueta de baetão azul, colete de fustão pintado e cala de pano pedrês.” Após a visão de Teresa, Simão transforma-se: distancia-se da ralé de Viseu; torna-se caseiro; cumpre os seus deveres de estudante; passeia pelo campo, procurando o espaço natural, em detrimento do espaço social. Mas quando Teresa é obrigada a sair da janela, local onde via Simão e, posteriormente, quando lhe comunica o desejo do seu pai de que ela se case com o seu primo Baltasar, Simão revela-se de novo rebelde. A par desta faceta, irá porém surgir uma outra: a sua nobreza de alma, que se manifesta no momento em que deseja poupar um dos criados de Baltasar, que tentara matar Simão, pelo facto de o homem se encontrar ferido.O seu sentimento exacerbado de honra é também notável – ele manifesta-se pelo facto de Simão enfrentar sempre aqueles que se lhes opõem, pelo facto de se ter negado a fugir, depois de ter morto Baltasar, em legítima defesa, e ainda por recusar qualquer ajuda da família, aceitando a sua condenação à forca e, depois, ao degredo. O seu código de honra conduzi-lo-á, em última análise, à sua tragédia.O sentimento de dignidade é, por outro lado, inseparável da possibilidade de realização do seu amor – é assim que Simão não acede ao pedido de Teresa, para que cumpra os dez anos de pena, em Portugal, na cadeia.
- Teresa: Teresa representa um tipo vulgar na galeria feminina das heroínas românticas do tempo: amorosa angelical, vítima indefesa num mundo que não lhe pertence, porque organizado para servir apenas o egoísmo arbitrário dos homens, é um ente sensível, frágil, tendencionalmente incorpóreo votado pela fatalidade para o deperecimento e a aniquilação. Mas essa sua personalidade ganha certa força na alternância desta fraqueza com uma também sua própria vocação para morrer insubmissa. É que no fundo nada consegue deter a determinação a que se entrega. “A desgraça não abala a minha firmeza, nem deve intimidar os teus projectos.” – escreve ela a Simão.
- Mariana: Mariana é a figura mais humana e mais complexa da obra. Mariana é vista como um símbolo de gratidão desinteressada: é a enfermeira sempre vigilante do filho do desembargador Domingos Botelho que salvara seu pai da forca. É um símbolo de generosidade discreta e delicada, pois dá ao hóspede bens pessoais, cuidava do preso com abundância e limpeza, e a todos dizia que ali estava por ordem e à custa da senhora D. Rita Preciosa. Mariana como um símbolo de amor humilde, puro: contenta-se com amar sem ser amada, fazendo do amor um serviço gratuito, uma dádiva prestada sem quaisquer esperanças de reciprocidade.
- Baltasar Coutinho: Baltasar vive na dupla função para que o autor o criou: ser, por um lado, uma simples peça dinâmica da intriga; por outro, surgir, pelos defeitos que encarna (covardia, perversão pelo interesse do sentimento amoroso, cinismo, vaidade, desdém), como elemento contrastante de Simão, cujas qualidades e simpatia avultam neste jogo de oposições intencionais.
- Tadeu de Albuquerque e Domingos Botelho: Estas duas personagens não diferem fundamentalmente uma da outra, como símbolos que são de pais despóticos, cuja autoridade se escuda por detrás de princípios morais de tónica puramente formal, já que sempre traem este ou aquele interesse pessoa mesquinho, manipuladores arbitrários que são de pessoas e instituições pela força do dinheiro, da pressão hierárquica e das relações comprometidas. Tadeu é figura mais conseguida que a de Botelho – sobretudo quando, para o fim da história, Camilo o descreve com os olhos encovados a reverem o suor e o sangue de uma raiva que pedia debalde vingança.
- João da Cruz: O ferrador ergue-se, ainda sobre o esqueleto do bom bandido, tão caro a ficção ultra-romântica, que Camilo nele de certo modo e insinua e absolve na apóstrofe com que comenta a morte do generoso protetor de seu tio paterno. Mas a carne que veste esqueleto é viva – e tão naturalmente viva, que até a função dinâmica para que o narrador criou a figura se perde e apaga.
- D. Rita:representa a convencionalidade do sentimento materno – age mais por obrigação familiar do que por motivos afetivos; ajuda Simão porque esse é o seu papel e não porque o amor de mãe a leve a perdoar e a compreender as atitudes do filho.
- Ritinha: distingue-se das outras irmãs de Simão pela sua capacidade afetiva e representa, para Simão, o único laço familiar genuíno, porque é conduzida por aquilo que sente e não pelas convenções que lhe são impostas. A sua ligação a Simão leva-a a ser ela a relatora da sua história ao autor da obra, quando este era criança.
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